quinta-feira, 10 de abril de 2014

Inflação disseminada põe o país em alerta


IPCA atinge 0,92% em março, o maior índice para o mês desde 2003. Liderados por alimentos e itens de transporte, sete de cada 10 produtos subiram. Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a alta é passageira
 
» ANTONIO TEMÓTEO
 
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deu um salto de 0,92% em março e superou as expectativas mais pessimistas dos analistas de mercado, que apostavam em uma elevação de 0,89%. É o pior indicador para o mês em 11 anos. Puxada pela forte elevação dos alimentos e do custo dos transportes, a inflação acumulada em 12 meses passou de 5,68%, em fevereiro, para 6,15%, encostando no limite de tolerância estabelecido pelo
Conselho Monetário Nacional (CMN), de 6,5% ao ano.
A aceleração do custo de vida aumentou a preocupação de analistas, investidores e governo com a saúde da economia, uma vez que, em apenas três meses, o IPCA acumula uma alta de 2,18%, quase a metade do centro da meta, de 4,5%. Divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os dados transmitem outro sinal inquietante: de cada 10 itens e serviços pesquisados, sete tiveram alta. Ou seja, a carestia é generalizada. Além disso, dos nove grupos de produtos monitorados, seis já ostentam, em 12 meses, aumento anual acima do teto.
A situação só não foi pior porque os preços controlados pelo governo subiram 3,4%, bem abaixo dos 7,14% dos produtos livremente comercializados. Em algum momento, porém, itens como gasolina e energia elétrica, que estão artificialmente represados, precisarão ser reajustados, o que pressionará ainda mais a inflação.
Apesar do susto, a presidente Dilma Rousseff determinou aos auxiliares que demonstrem calma. Ela está convencida de que os preços dos alimentos, que responderam por 51% do IPCA de março, vão ceder. O Planalto sustenta o discurso  com base na primeira prévia do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) de abril, que cravou alta de 0,72%, contra 1,16% de igual período do mês anterior. Para o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, a alta do IPCA é temporária porque reflete, sobretudo, um choque de preço dos alimentos.
O otimismo do governo, no entanto, não consegue convencer os analistas de grandes instituições. O economista-chefe do Banco Mundial para América Latina e Caribe, Augusto de la Torre, observa que o Brasil enfrenta uma difícil combinação de inflação alta e baixo crescimento. Segundo ele, o Ministério da Fazenda precisa adotar uma política fiscal mais austera para que o Banco Central possa reduzir a taxa de juros. A falta de rigor fiscal, avalia De la Torre, é o que explica por que os preços continuam sob pressão, mesmo num cenário de baixa atividade econômica. “Normalmente, isso não ocorre”, explicou.
A gerente da pesquisa de inflação do IBGE, Eulina Nunes dos Santos, avaliou que, além do grupo alimentos e bebidas, que subiu 1,92% em março, o item transportes teve peso significativo no IPCA ao cravar alta de 1,38%. Somados, os dois componentes representam 79% do índice. Ela considerou também que a falta de chuvas comprometeu a produção de várias lavouras.
Como a estiagem não deve acabar nos próximos meses, o preço dos alimentos vai ceder lentamente. “Além de prejudicar a quantidade e a qualidade dos alimentos, a seca produziu efeitos indiretos. A alta do milho encareceu a ração animal, o que teve impacto sobre carnes e leite. E o trigo afetou o preço de pães e farinhas”, explicou Eulina.
Para o economista-sênior do Espirito Santo Investment Bank Flávio Serrano, o resultado do IPCA de março  torna difícil qualquer previsão sobre a mudança do cenário. Para ele, a desaceleração será lenta, uma vez que a estiagem ainda continuará, por um bom tempo, mantendo elevados os custos de grãos e de insumos. Ele alertou que o índice de difusão, que mede a quantidade de produtos e serviços com comportamento de alta, continua em trajetória ascendente.
Na avaliação de Serrano, a carestia generalizada torna mais difícil a tarefa do Banco Central de fazer os preços convergirem para o centro da meta. “Esse cenário aumenta as chances de a inflação terminar o ano bem próxima do limite, de 6,5%. Ela está se estabilizando em torno dos 6%, deve permanecer assim em 2015, e isso é ruim para confiança, aumenta a volatilidade da economia e afugenta investidores”, completou.
Eleições
O líder do Democratas na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), atribuiu a alta da inflação aos erros do governo. “O descontrole da política econômica chega com força à mesa do brasileiro, que paga pela incompetência da dita ‘gerentona’, a presidente Dilma Rousseff”, criticou.
Motivo de preocupação cada vez maior para a população, a carestia deverá ser tema central nas eleições de outubro. A dona de casa Maria Selma de Campos Santos, 53 anos, diz que levará o assunto em conta na hora de escolher o candidato a presidente. Não bastasse o custo do tomate, que aumentou 32,85% em março, e da batata-inglesa, que disparou 35,05%, ela reclama da baixa qualidade dos produtos nas gôndolas. “Sei que a falta de chuvas prejudica a produção, mas quando a qualidade é boa a gente faz um sacrifício e compra. Nem isso está acontecendo. Tudo está caro e feio. Isso precisa mudar.”
 


 

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